Ontem fui ao Motown Museum, que era um passeio importante que ainda faltava eu fazer em Detroit. Eu sempre achei que não iria aproveitar muito a visita a esse museu, (sempre imaginei que) conheço pouco as músicas e artistas dessa gravadora que fez história. Nem sonhava que reconheceria muitas músicas das quais eu não sabia nem o nome ou o artista, mas que já tinha ouvido várias vezes! Também não sou fã de memorabilia (os objetos dos famosos que são colecionados e expostos, como no Hard Rock Cafe por exemplo) e achei que o museu não ofereceria muito além disso. Foi ótimo descobrir que eu estava redondamente enganada!
Como é o Tour do Motown Museum
O museu fica nas duas casas que eram o coração da gravadora criada por Berry Gordy em 1959 com dinheiro emprestado pela sua família empreendedora. Você não visita essas duas casas históricas por conta própria – a visita inteira é guiada, e isso foi o que fez toda a diferença. O nosso guia foi o Glen, que cantou, dançou, bateu palmas e assoviou um monte das músicas famosas pra explicar quem era quem – pra mim, que não sabia os nomes de quase ninguém e de praticamente nenhuma das músicas, foi uma ótima surpresa descobrir que eu já tinha ouvido quase todas que ele cantou; essa foi a diferença entre um ótimo tour e um que não teria muita graça. Não sei se todos os guias fazem um tour tão musical quanto o dele, espero que sim! O tour durou mais ou menos uma hora e o grupo tinha umas 30 pessoas, a maioria visitantes de outras cidades americanas, de idades variadas. Pra quem não entende inglês muito bem vai ser um pouco difícil acompanhar, porque é tudo bem rapidinho, sem tempo para perguntas.
Sobre o Museu Motown e a minha visita
Alguns esclarecimentos importantes antes de eu começar a falar como foi o tour: o museu é relativamente pequeno, fica bem cheio no verão, mesmo num dia de semana a gente chegou e tinha uma fila grande na porta. Não conseguimos entrar no tour de 13h e tivemos que esperar o de 13h30. Segundo o diretor de Social Media com quem conversei, quanto mais cedo você chega, menos fila vai encontrar – e no inverno eles recebem menos visitantes. Não é permitido fotografar dentro do museu de jeito nenhum, nem com celular nem na fila de espera pra comprar o ingresso, e bolsas grandes tem que ser deixadas no guarda-volumes. Como eu estava lá visitando como “imprensa”, tive que assinar uma papelada pra ser autorizada a fotografar somente o Studio A no final do tour, e a minha visita foi gratuita. O tour que eu fiz não foi diferenciado, não era um grupo de imprensa e sim um grupo de turistas, e só depois que acabou a visita guiada e saímos da casa é que eu bati um papo com um dos diretores pra fazer algumas perguntas (e pra reclamar que não pode tirar foto! 😉 ).
Começando o Tour com o Glen
O tour começou no primeiro andar ao lado da bilheteria, o nosso guia se apresentou e falou das casas onde hoje funciona o museu e as demais casas do quarteirão que foram sendo compradas pela gravadora. As duas principais, onde aconteciam as gravações propriamente ditas, são as que foram transformadas no Motown Museum. As demais são usadas atualmente como escritórios administrativos do museu. Era um verdadeiro “quarteirão Motown”! Cada casa tinha uma função, uma era o escritório financeiro, a outra era onde os artistas eram treinados de dança a etiqueta, mas as casas que funcionavam mesmo 24 horas e 7 dias por semana eram as duas casas onde o pessoal se reunia para tocar, cantar, e gravar.
De lá descemos alguns degraus pra entrar em um antigo estúdio, onde assistimos um filme contando um pouco sobre a história da gravadora e seus principais artistas – The Temptations, The Supremes, Jackson Five, Stevie Wonder, entre outros. O fundador, Berry Gordy (ainda vivo) conta como começou um dos maiores sucessos da história musical americana.
Depois do filme subimos as escadas para o segundo andar, cheio de fotos, discos de ouro, capas de discos e outros objetos importantes (um chapéu e luva de Michael Jackson entre eles), e aí sim o Glen começou a contar a história toda desde o início. Berry Gordy vinha de uma família negra empreendedora – tanto seu pai quanto sua mãe tinham seus negócios – e que incentivava os filhos a fazerem o mesmo. Eles tinham uma “caixinha” onde todos os filhos que trabalhavam colocavam $10 por mês, e se alguém precisasse de dinheiro emprestado tinha que apresentar o projeto pra família inteira aprovar ou não. Berry pediu um empréstimo de 1000 dólares – e recebeu 800 para começar o seu negócio – tudo devidamente documentado e assinado, dizendo quando ele ia pagar de volta. Ele registrou primeiro Tamla Records, e depois Motown.
Logo começaram os sucessos: em 1959, ainda com o nome Tamla, a música “Money (That’s What I Want)” gravada por Barrett Strong foi o primeiro sucesso de Motown (e eu tenho certeza que você já deve ter ouvido, clica aí no vídeo pra ouvir).
Depois vieram grupos como Four Tops, The Temptations, The Supremes, Jackson 5, cantores como Marvin Gaye, Stevie Wonder (que tinha 11 anos quando assinou com a gravadora!)…Dá uma olhada nesse vídeo do Four Tops e Temptations e me diga se vocês não conhecem as músicas:
Os novos músicos que eram lançados passavam por uma “fábrica de artistas”: aprendiam a falar e se comportar em público (eram os “embaixadores negros em uma cultura branca”), tinham aula de etiqueta, aprendiam as coreografias para suas performances, experimentavam seus figurinos especialmente confeccionados…e a fórmula provou dar muito certo: era um sucesso atrás do outro. Eles eram ensinados a se “comportar como realeza”. Um grupo de 12 compositores escrevia as músicas para todos os artistas, e um grupo de músicos, os Funk Brothers, tocava nas gravações de todos eles (esse grupo que vivia “nas sombras” dos famosos gravou mais músicas que foram pro número 1 das paradas de sucesso que os Beatles, Rolling Stones, Elvis e The Beach Boys juntos!). Um videozinho com eles:
O “Motown Sound” era uma mistura de rhythm and blues com pop, e as músicas de sucesso foram regravadas por vários artistas dos múltiplos selos da gravadora (exemplo que ele nos deu: “I heard it through the Grapevine“, a versão mais famosa é de Marvin Gaye (veja abaixo), mas foram inúmeras versões – que o Glen cantou pra gente ver as diferenças!). Nosso guia nos apresentou a um componente importante usado em inúmeros hits da Motown: a “câmara de eco”. Um buraco no teto que dava para o sótão fechado de forma a fazer o som reverberar, amplificando palmas e estaladas de dedo muito usadas para acompanhar uma infinidade de sucessos da gravadora (e isso vocês tem que ver com os seus próprios olhos, a “demonstração” que o Glen nos deu batendo palmas, estalando os dedos e cantando pedacinhos de um monte de músicas famosas, foi demais!). Ele contou que muitas vezes os músicos chamavam as crianças brincando na rua pra “bater palmas por 5 dólares” e a criançada corria toda feliz porque 5 dólares naquela época comprava doce pra caramba 😉
No início as capas dos discos da Motown eram somente ilustradas, não saíam com as fotos dos artistas, por causa do preconceito racial. Mas a música foi tomando conta dos programas de rádio, os jovens brancos que ouviam a voz não sabiam a cor de quem cantava, e quando a música fazia muito sucesso e os cantores apareciam na TV é que a maioria branca começou a ver que os músicos eram negros. Esse foi o momento nos EUA quando a música negra cruzou a fronteira racial e passou a fazer sucesso com a maioria branca. Daí em diante os discos começaram a ser lançados com as fotos dos artistas nas capas. Por causa de uma limitação de que os rádios não poderiam tocar músicas somente de artistas do mesmo selo, Berry Gordy criou vários selos diferentes e espalhou seus artistas para fugir desse problema (era comum na época).
Vimos um dos chapéus e a famosa luva de Michael Jackson, que ele doou para o museu pessoalmente, afinal foi na Motown que ele começou ainda criança, cantando com seus irmãos no grupo Jackson 5 (veja vídeo). Algumas das roupas usadas pelas cantoras da gravadora, muitas fotos e capas de disco. Passamos pela área onde Berry Gordy viveu com a família e a mesa na sala usada para organizar a correspondência da gravadora e enviar discos para o mundo inteiro (que eram colocados diretamente no posto do correio ali pertinho).
Descemos então para a área do estúdio, onde ficava a secretária (que depois passou a ser cantora!), onde ficavam as máquinas de cigarros, de doce (que o Stevie Wonder nos seus tenros 11 anos adorava, e o pessoal deixava moedinhas pra ele em cima da máquina pra ele pegar os seus chocolates preferidos – a máquina está lá ainda), passamos pela sala de controle e entramos no Studio A, que foi onde todos esses artistas gravaram seus sucessos. Ouçam abaixo gravações originais do Stevie Wonder então com 12 anos de idade:
O Studio A ficava na garagem da casa, que foi revestida com material apropriado acusticamente e vários instrumentos originais ainda estão lá, incluindo o piano que tem mais de 100 anos. Por causa dos microfones pendurados no teto, o estúdio ganhou o apelido de “snake pit” (ninho das cobras). Várias fotos do Studio A sendo usado pelos artistas da Motown estão espalhadas pelas paredes, e era ali que Berry Gordy fazia as reuniões com todo o pessoal da gravadora pra ouvir cada nova música e decidir se ela estava pronta para ser lançada ou não. Ele colocava a música pra tocar e olhava pra todo mundo, impassível, pra no final perguntar: “se você só tivesse dinheiro pra comprar um sanduíche ou esse disco, você compraria o disco?” Se a resposta fosse positiva, a música seria lançada. Uma verdadeira fábrica de sucessos!
O nosso guia encerrou o tour pedindo então pro grupo inteiro acompanhá-lo cantando “My Girl“, gravada por The Temptations, música número 1 do grupo e um dos grandes sucessos de Motown. E pros que não sabiam a letra (todo mundo sabia, acho que só eu que sabia mais ou menos) estavam ali as partituras e as letras, no mesmo lugar que os músicos usavam.
Em 1972 Motown Records se mudou de Detroit para Los Angeles, porque Gordy foi atrás de uma indústria maior ainda: Hollywood. Os residentes da motor city se sentiram traídos pela mudança, mas Gordy conseguiu fazer alguns filmes, e reside na Califórnia até hoje. Mas os anos de ouro da gravadora foram mesmo em Detroit.
Vale a pena visitar o Motown Museum?
Eu fiquei positivamente surpresa com a visita, achei muito interessante e nem sabia que conhecia tantas músicas de sucesso da Motown. Para quem é fã desses artistas e músicas, o tour é imperdível. Se você é como eu e não sabe muito sobre a gravadora e seus sucessos mas gostaria de conhecer um pouco mais, é um passeio fácil (as casas são pequenas e o tour não é muito longo) e pode ser combinado num dia de visita aos outros museus de Midtown. A única dificuldade maior mesmo pode ser com o inglês, já que é tudo falado, não tem nada escrito ou nenhum folheto.
Com crianças: A Julia prestou atenção (ela adora música) e disse que gostou, mas pra uma criança que não entende inglês não acho que vai ser uma boa. Ela era a criança mais nova no nosso grupo (5 anos), as demais tinham de 8 anos pra cima (teve uma hora que o guia perguntou e cada uma falou sua idade). O Eric não quis ficar, saiu logo no início, como eu esperava.
Informações úteis:
Motown Museum
Endereço: 2648 West Grand Boulevard, Detroit, Michigan 48208
Telefone: (313) 875-2264
Horário: 10h-18h de segunda a sábado*, último tour começa as 17h. Fechado aos domingos. *Fora do verão, o museu fecha as segundas também. Fechado na maioria dos feriados americanos.
Preços: $10 adultos e $8 para idosos e crianças de 5 a 12 anos. Crianças menores de 5 anos não pagam.
Confira sempre os preços e horários no site oficial antes da sua visita.
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Juliana says
Adorei, já tinha uma vontade enorme de conhecer a Motown, agora tenho mais ainda! Tomara que quando for a minha vez, eu tenha a sorte de ter um guia assim!!
P.S.: Acho que não aguentaria ouvir “My Girl”, que foi trilha sonora da minha infância, dentro da Motown… Será que eles oferecem lencinho para as lágrimas? hahaha
Ótima matéria, Beijos Lu!
Luciana Misura says
Hehehe não, mas se chorar não vai ter problema!